BR102019009919A2 - Bioconjugados polímero-fármaco, composições farmacêuticas, processo de obtenção e uso - Google Patents
Bioconjugados polímero-fármaco, composições farmacêuticas, processo de obtenção e uso Download PDFInfo
- Publication number
- BR102019009919A2 BR102019009919A2 BR102019009919-4A BR102019009919A BR102019009919A2 BR 102019009919 A2 BR102019009919 A2 BR 102019009919A2 BR 102019009919 A BR102019009919 A BR 102019009919A BR 102019009919 A2 BR102019009919 A2 BR 102019009919A2
- Authority
- BR
- Brazil
- Prior art keywords
- dox
- drug
- bioconjugates
- polymer
- cmc
- Prior art date
Links
Images
Classifications
-
- A—HUMAN NECESSITIES
- A61—MEDICAL OR VETERINARY SCIENCE; HYGIENE
- A61K—PREPARATIONS FOR MEDICAL, DENTAL OR TOILETRY PURPOSES
- A61K31/00—Medicinal preparations containing organic active ingredients
- A61K31/70—Carbohydrates; Sugars; Derivatives thereof
- A61K31/7028—Compounds having saccharide radicals attached to non-saccharide compounds by glycosidic linkages
- A61K31/7034—Compounds having saccharide radicals attached to non-saccharide compounds by glycosidic linkages attached to a carbocyclic compound, e.g. phloridzin
- A61K31/704—Compounds having saccharide radicals attached to non-saccharide compounds by glycosidic linkages attached to a carbocyclic compound, e.g. phloridzin attached to a condensed carbocyclic ring system, e.g. sennosides, thiocolchicosides, escin, daunorubicin
-
- A—HUMAN NECESSITIES
- A61—MEDICAL OR VETERINARY SCIENCE; HYGIENE
- A61P—SPECIFIC THERAPEUTIC ACTIVITY OF CHEMICAL COMPOUNDS OR MEDICINAL PREPARATIONS
- A61P35/00—Antineoplastic agents
Landscapes
- Health & Medical Sciences (AREA)
- Life Sciences & Earth Sciences (AREA)
- Molecular Biology (AREA)
- Chemical & Material Sciences (AREA)
- Medicinal Chemistry (AREA)
- Pharmacology & Pharmacy (AREA)
- Epidemiology (AREA)
- Animal Behavior & Ethology (AREA)
- General Health & Medical Sciences (AREA)
- Public Health (AREA)
- Veterinary Medicine (AREA)
- Medicinal Preparation (AREA)
Abstract
A presente tecnologia se refere a bioconjugados polímero-fármaco biofuncionalizados com o tripeptídeo RGD e um agente de penetração por meio de um agente reticulador. Os bioconjugados são baseados na conjugação covalente ou eletrostática de um polímero, preferencialmente a carboximetilcelulose, com um fármaco, preferencialmente a doxorrubicina (DOX), e biofuncionalização com os peptídeos (tri-peptídeos, RGD) e um agente de penetração, preferencialmente o aminoácido L-arginina (R). Tais bioconjugados foram sintetizados visando preferencialmente a aplicações clínicas na quimioterapia direcionada a células tumorais. A tecnologia se refere ainda ao processo de obtenção dos bioconjugados, a partir do qual é possível a produção de nanopartículas coloidais. A tecnologia trata também do uso dos bioconjugados para obtenção de medicamentos, e de composições farmacêuticas contendo os bioconjugados. Os bioconjugados biofuncionalizados se comportam como eficientes pró-fármacos, promovendo significativa redução da citocixidade em células normais, ao mesmo tempo em que mantêm elevada a capacidade de provocar a morte de células tumorais.
Description
[01] A presente tecnologia se refere a bioconjugados polímero-fármaco biofuncionalizados com o tripeptídeo RGD e um agente de penetração por meio de um agente reticulador. Os bioconjugados são baseados na conjugação covalente ou eletrostática de um polímero, preferencialmente a carboximetilcelulose (CMC), com um fármaco, preferencialmente a doxorrubicina (DOX), e biofuncionalização com os peptídeos (tri-peptídeos, RGD) e um agente de penetração, preferencialmente o aminoácido Larginina (R). Tais bioconjugados foram sintetizados visando preferencialmente a aplicações clínicas na quimioterapia direcionada a células tumorais. A tecnologia se refere ainda ao processo de obtenção dos bioconjugados, a partir do qual é possível a produção de nanopartículas coloidais. A tecnologia trata também do uso dos bioconjugados para obtenção de medicamentos, e de composições farmacêuticas contendo os bioconjugados. Os bioconjugados biofuncionalizados se comportam como eficientes pró-fármacos, promovendo significativa redução da citocixidade em células normais, ao mesmo tempo em que mantêm elevada a capacidade de provocar a morte de células tumorais.
[02] Apesar dos inegáveis avanços científicos e tecnológicos relacionados ao tratamento de câncer nas últimas décadas, a doença continua sendo uma das principais causas de mortalidade no Brasil e no mundo. Terapias convencionais, como a quimioterapia, evidenciam relativo sucesso como método terapêutico por ocasionarem intensa morte celular, mas muitas vezes resultam em toxicidade e graves efeitos colaterais por não apresentarem elevada especificidade às células tumorais. Desse modo, torna-se imprescindível o desenvolvimento de novas terapias capazes de atuarem de forma efetiva e específica em células tumorais, provocando a menor toxicidade possível em células normais ou, idealmente, preservando integralmente células e tecidos saudáveis.
[03] Dentre as várias drogas existentes, a doxorrubicina (DOX) é um agente antitumoral amplamente utilizado para o tratamento de diferentes tumores, sendo considerado padrão de excelência para quimioterapia e muitas vezes adotada como modelo de droga anticancerígena para o desenvolvimento e avaliação de conjugados macromoleculares. Além disso, do ponto de vista da identificação da droga, a DOX possui propriedades óticas intrínsecas devido à presença do grupo cromóforo antraciclina em sua estrutura, o que permite a sua utilização para obtenção de imagens que fornecem informações sobre a distribuição de drogas em células e tecidos.
[04] A produção de conjugados projetados e adaptados a necessidades específicas fornece uma abordagem sintética que pode superar a maioria das desvantagens relacionadas à falta de seletividade da doxorrubicina na quimioterapia tradicional. A produção de estruturas macromoleculares por meio da conjugação covalente de moléculas antitumorais com polímeros favorece em muitos casos a redução da imunogenicidade, melhora a solubilidade em meio aquoso e fisiológico, aumenta a estabilidade e o tempo de circulação no sangue e reduz a toxicidade dos conjugados, características que aumentam o valor terapêutico da droga antitumoral.
[05] O trabalho desenvolvido por Ringsdorf (1975) propôs um modelo composto por polímero conjugado que impulsionou o interesse por conjugados baseados em polímeros e fármacos para a administração de drogas visando terapia antitumoral. Basicamente, o modelo consiste em uma cadeia polimérica biocompatível, um segmento solubilizante, um fármaco ligado covalentemente (com ou sem a presença de um agente de ligação intermediário), e um segmento de direcionamento para a construção de sistemas de liberação de drogas multifuncionais (DDS). Esse conceito tem sido uma das abordagens mais efetivas e prevalentes para superar os problemas de toxicidade e falta de especificidade dos sistemas de administração de medicamentos pela quimioterapia tradicional (Ringsdorf, H. J. (1975) Structure and properties of pharmacologically active polymers. J. Polym. Sci., Polym. Symp. 51, 135−153./ Basu, A., Kunduru, K. R., Abtew, E., and Domb, A. J. (2015) Polysaccharide-based conjugates for biomedical applications. Bioconjugate Chem. 26, 1396−1412./ Larson, N., and Ghandehari, H. (2012) Polymeric conjugates for drug delivery. Chem. Mater. 24, 840−853.)
[06] Embora a ampla maioria dos conjugados polímero-fármaco explore o direcionamento passivo, têm sido desenvolvidas abordagens ativas com a utilização de moléculas direcionadoras, como os peptídeos, as proteínas e os folatos. Dentre as várias alternativas de direcionamento de moléculas para terapia anticancerígena, um grande número de peptídeos baseados na sequência de reconhecimento RGD (Arg-Gly-Asp) foi desenvolvido nas últimas duas décadas. A sequência RGD se liga preferencialmente à integrina αvβ3, que é (super)expressa em células endoteliais tumorais, em glioblastomas, melanomas, cânceres de ovário, mama e próstata. Dessa forma, a utilização de pró-fármacos baseados em RGD possibilita o direcionamento dos mesmos aos receptores de integrinas de tumores malignos altamente letais, tais como glioblastomas, podendo oferecer promissoras perspectivas diagnósticas e terapêuticas para melhorar o prognóstico dos pacientes. De forma semelhante, os peptídeos penetrantes de células (CPPs), como as classes de CPPs enriquecidas com arginina, entram eficientemente nas células e medeiam a passagem de macromoléculas que sozinhas não seriam capazes de atravessar a membrana plasmática.
[07] O artigo de Cera e colaboradores (1987), intitulado “Anthracycline antibiotics supported on water-soluble polysaccharides: synthesis and physicochemical characterization”, descreve a obtenção de conjugados por ligação covalente entre doxorubicina (DOX) e carboximetilcelulose (CMC) ativada por azida. O complexo CMC-DOX obtido apresenta, em relação à doxoribicina livre, propriedades de oxirredução inalteradas, mantendo alguma atividade anticâncer. No entanto, uma vez que a formação de conjugados complexos por ligação covalente pode afetar drasticamente o mecanismo de ação de fármacos, é perdida a capacidade de ligação ao DNA. Em estudo posterior dos mesmos autores, foi verificado que os conjugados obtidos apresentam atividade antitumoral reduzida, uma vez que a atividade mantida de ligação à membrana tem contribuição mínima na citotoxicidade (C. Cera, M. Terbojevich, A. Cosani and M. Palumbo. Anthracycline antibiotics supported on water-soluble polysaccharides: synthesis and physicochemical characterization; Department of Organic Chemistry, University of Padua, Via Marzolo I, 35131 Padua, Italy, 1987/ Cera, C; Palumbo, M; Stefanelli, S; Rassu, M; Palu, G. (1992). Watersoluble polysaccharide anthracycline conjugates - biological-activity. Anticancer Drug Design, 7(2), 143–151).
[08] O documento de patente CN104961800 (Polypeptide-antharcycline derivative – prioridade 03/07/2015) descreve um composto formado pela ligação covalente de antraciclinas, como a doxorubicina, a um peptídeo de sequência Tyr-Ile-Gly-Ser-Arg. O composto obtido é direcionado seletivamente a sítios tumorais pela ligação a um receptor de membrana de 67 kDa, podendo ser capaz de reduzir a toxicidade e os efeitos adversos do fármaco.
[09] Nádia S.V e colaboradores (2018), no artigo intitulado “Bioengineered carboxymethyl cellulose-doxorubicin prodrug hydrogels for topical chemotherapy of melanoma skin câncer”, descrevem um conjugado composto por CMC-DOX a partir do qual se obtém, por meio de ligações cruzadas de ácido cítrico, um hidrogel que pode ser usado no tratamento de câncer de pele. Nos ensaios de citotoxicidade, nenhuma diferença estatística foi verificada quanto à viabilidade celular de células normais e tumorais na mesma condição de ensaio, ou seja, a doxorubicina livre e os conjugados sintetizados apresentaram citotoxicidade semelhante para células normais e células cancerígenas. Dessa forma, o conjugado sintetizado não é capaz de reduzir os efeitos adversos e a toxicidade do fármaco antitumoral, mas apenas retardar a sua liberação, através de modulação da cinética (Capanema, N. S. V, Mansur, A. A. P., Carvalho, S. M., Carvalho, I. C., Chagas, P., Carlos, L., Mansur, H. S. (2018). Bioengineered carboxymethyl cellulose-doxorubicin prodrug hydrogels for topical chemotherapy of melanoma skin cancer. Carbohydrate Polymers, 195(April), 401–412).
[010] Embora os conjugados polímero-fármaco sejam objetos de crescente interesse nas últimas décadas, não foi encontrado no estado da técnica documento que descreva bioconjugados compostos por carboximetilcelulose (CMC) conjugados com fármacos, preferencialmente a doxorrubicina (DOX), funcionalizados por peptídeos para direcionamento específico para células tumorais enriquecidas com integrina, causando a morte de células tumorais enquanto minimiza os efeitos colaterais negativos do fármaco em células normais.
[011] A carboximetilcelulose (CMC) apresenta baixo custo e elevada disponibilidade comercial, é amplamente utilizada em vários campos tecnológicos, incluindo nutrição e farmacêutico, e possui boa biocompatibilidade. Outra característica que favorece sua aplicação biológica é sua solubilidade em água, que ocorre em uma ampla faixa de pH, inclusive em condições fisiológicas.
[012] A presente tecnologia refere-se preferencialmente a bioconjugados baseados em CMC-DOX e peptídeos modificadores (RGD e L-arginina), ligados separadamente ou em conjunto, capazes de atuar simultaneamente no direcionamento específico para receptores de membranas do tipo integrinas, além de causar morte de células cancerígenas, visando melhorar a eficiência quimioterápica e minimizar os efeitos adversos em células normais. A tecnologia se refere também ao processo de obtenção dos bioconjugados, a composições farmacêuticas contendo os bioconjugados e ao seu uso para fabricação de medicamentos. Essas estratégias oferecem excelentes perspectivas para o tratamento de câncer por quimioterapia direcionada.
[013] Os bioconjugados CMC-DOX-peptídeos foram obtidos e extensivamente caracterizados quanto às suas propriedades e aplicações quimioterápicas para tratamento de câncer. Os bioconjugados CMC-DOXpeptídeos foram desenvolvidos e produzidos como pró-drogas inteligentes para, de forma simultânea, serem direcionados para células tumorais e aumentarem a eficácia de morte de células cancerígenas, enquanto preservam células saudáveis da citotoxicidade inerente de drogas antitumorais, sendo promissoras em aplicações de quimioterapia para tratamento de câncer.
[014] A Figura 1 é a representação esquemática dos bioconjugados polímero-fármaco construídos segundo modelo de Ringsdorf. Componentes: CMC (1) e DOX (2) RGD (3) e L-arginina (4). Os círculos vermelhos indicam as ligações de clivagem.
[015] A Figura 2 é a representação da fórmula química estrutural das moléculas precursoras para construção dos conjugados polímero-fármaco: (a) Polímero – carboximetilcelulose (CMC); (b) Doxorrubicina (DOX); (c) Vetor Arg-Gly-Asp (RGD); (d) Agente de penetração - L-arginina (R); (e) Agente reticulador - EDC.
[016] A Figura 3 é a representação esquemática dos conjugados prófármacos construídos: (a) CMC-DOX; (b) CMC-DOX-RGD.
[017] A Figura 4 é a representação gráfica dos espectros de FTIR para produtos (a) CMC, (b) CMC-DOX, (c) CMC-DOX-RGD e (d) CMC-DOXRGD-R.
[018] A Figura 5 é a representação gráfica do espectro de absorção na região do visível para (a) DOX, (b) CMC, (c) CMC-DOX, (d) CMC-DOXRGD e (e) CMC-DOX-RGD-R. Imagens digitais para (B) DOX, (C) CMCDOX e (D) CMC.
[019] A Figura 6 é a representação gráfica do espectro de emissão para (a) DOX, (b) CMC-DOX, (c) CMC-DOX-RGD, (d) CMC-DOX-RGD-R e (e) CMC.
[020] A Figura 7 demonstra o potencial zeta (ZP) em função do pH do meio e conjugados pró-fármaco (ou polímero-droga): (a) CMC-DOX; (b) CMC-DOX-RGD; e (c) CMC-DOX-RGD-R. (d) Valores de ZP para todos os conjugados em PBS (pH 7,4, detalhe).
[021] A Figura 8 é a representação esquemática (A) dos bioconjugados com estrutura “núcleo-casca” em meio aquoso; e as imagens (B) obtidas por TEM dos nanoconjugados polímero-fármacos.
[022] A Figura 9 é a representação gráfica da liberação da DOX in vitro em pH = 4 a 6 (A) e pH = 6 a 8 (B), para os sistemas polímero-fármaco (a) DOX livre, (b) CMC-DOX, (c) CMC-DOX-RGD, e (d) CMC-DOX-RGD-R.
[023] A Figura 10 é a representação gráfica da resposta de viabilidade celular por ensaio MTT (HEK 293T; SAOS; U-87 MG; MCF7) em 24 h de incubação com DOX livre e conjugados CMC-DOX nas concentrações: (A) 1,0 µM e (B) 10,0 µM.
[024] A Figura 11 é a representação gráfica dos resultados de viabilidade celular obtidos através de ensaio de MTT para células (A) HEK 293T e (B) U-87 MG após 24 h de incubação com DOX livre e conjugados CMC-DOX nas concentrações de 1,0 µM e 10,0 µM.
[025] A Figura 12 compreende imagens da célula HEK 293T em (A) amostra controle e após 24 h de contato com (B) CMC-DOX, (C) CMCDOX-RGD e (D) CMC-DOX-RGD-R com concentração de DOX de 10,0 µM (barra de escala = 200 µm).
[026] A Figura 13 são imagens da célula U-87 MG em (A) amostra controle e após 24 h de contato com (B) CMC-DOX, (C) CMC-DOX-RGD e (D) CMC-DOX-RGD-R com concentração de DOX igual a 10,0 µM (barra de escala = 200 µm). Setas indicam vesículas múltiplas.
[027] A Figura 14 apresenta curvas de dose-resposta em função do sistema polímero-droga: (A) DOX livre, (B) CMC-DOX, (C) CMC-DOX-RGD e (D) CMC-DOX-RGD-R para as quatro células em avaliação ((a) HEK 293T; (b) SAOS; (c) U-87 MG; e (d) MCF7).
[028] A Figura 15 é a representação gráfica dos resultados de IC50 para a DOX livre e nanoconjugados pró-drogas (CMC-DOX, CMC-DOX-RGD, CMC-DOX-RGD-R).
[029] A Figura 16 é a representação gráfica da viabilidade celular utilizando ensaio CVS após 6 h (A, C) e 24 h (B, D) de incubação das células HEK 293T e U-87 MG com DOX livre e conjugados de CMC-DOX nas concentrações de 1,0 µM (A, B) e 10,0 µM (C,D).
[030] A Figura 17 apresenta imagens de CLSM da internalização da DOX livre (A) e dos sistemas pró-drogas (B) CMC-DOX, (C) CMC-DOX-RGD e (D) CMC-DOX-RGD-R, em células HEK 293T após incubação por (a) 15 min, (b) 30 min, (c) 60 min, (d) 2 h e (e) 6 h (barra de escala = 10 µm).
[031] A Figura 18 apresenta imagens de CLSM da internalização da DOX livre (A) e dos sistemas pró-drogas (B) CMC-DOX, (C) CMC-DOX-RGD e (D) CMC-DOX-RGD-R, em células U-87 MG após incubação por (a) 15 min, (b) 30 min, (c) 60 min, (d) 2 h e (e) 6 h (barra de escala = 10 µm).
[032] A Figura 19 é a ilustração dos três estágios principais do complexo processo de liberação dos nanocarreadores da droga para a célula.
[033] A Figura 20 é a representação gráfica dos valores de Intensidade Média de Fluorescência obtidos para as células HEK 293T e U-87 MG após 15 min (Estágio 1) de incubação com a DOX livre e com os bioconjugados.
[034] A Figura 21 apresenta imagens de campo claro e de fluorescência sobrepostas (coluna da esquerda) e seus respectivos perfis de intensidade de fluorescência ao longo das linhas X-X (coluna da direita) para células HEK 293T incubadas com (A) DOX, (B) CMC-DOX, (C) CMC-DOX-RGD e (D) CMC-DOX-RGD-R por 6 h (barra de escala = 10 µm).
[035] A Figura 22 apresenta perfis de intensidade de fluorescência da emissão vermelha no núcleo para a célula (A) HEK 293T e (B) U-87 MG após incubação com (a) DOX, (b) CMC-DOX, (c) CMC-DOX-RGD e (d) CMC-DOX-RGD-R.
[036] A Figura 23 apresenta imagens de microscopia confocal evidenciando a internalização celular e a distribuição de DOX (A) e dos conjugados polímero-fármaco-peptídeo (B, CMC-DOX-RGD) por células U87 MG. (a) Marcação de DNA com TO-PRO® -3 na cor azul; (b) Emissão de DOX no vermelho; (c) Imagem sobrepostas de ambos os biomarcadores (barra de escala = 10 µm).
[037] A Figura 24 apresenta imagens de microscopia de fluorescência evidenciando (a) emissão verde do LysoTracker® , (b) emissão vermelha da DOX, e (c) imagens de CLSM sobrepostas dos dois biomarcadores para células (A) HEK 293T e (B) U-87 MG após incubação de 30 min e 2 h com o conjugado CMC-DOX-RGD-R (barra de escala = 10 µm).
[038] A Figura 25 apresenta imagens de fluorescência do marcador (a) Anexina V - Alexa Fluor™ 488 nas células apoptóticas de HEK 293T após incubação com DOX livre (A) e com os sistemas de pró-drogas ((B) CMCDOX, (C) CMC-DOX-RGD e (D) CMC-DOX-RGD-R) por 6 h. (b) Imagens de fluorescência da DOX e (c) Campo claro + imagens sobrepostas de Anexina V-Alexa Fluor™ 488 e DOX (barra de escala = 10 µm).
[039] A presente tecnologia se refere a bioconjugados polímero-fármaco biofuncionalizados com o tripeptídeo RGD e um agente de penetração por meio de um agente reticulador. Os bioconjugados são baseados na conjugação covalente ou eletrostática de um polímero, preferencialmente a carboximetilcelulose (CMC), com um fármaco, preferencialmente a doxorrubicina (DOX), e biofuncionalização com os peptídeos (tri-peptídeos, RGD) e um agente de penetração, preferencialmente o aminoácido Larginina (R). Tais bioconjugados foram sintetizados visando preferencialmente a aplicações clínicas na quimioterapia direcionada a células tumorais. A tecnologia se refere ainda ao processo de obtenção dos bioconjugados, a partir do qual é possível a produção de nanopartículas coloidais. A tecnologia trata também do uso dos bioconjugados para obtenção de medicamentos, e de composições farmacêuticas contendo os bioconjugados. Os bioconjugados biofuncionalizados se comportam como eficientes pró-fármacos, promovendo significativa redução da citocixidade em células normais, ao mesmo tempo em que mantêm elevada a capacidade de provocar a morte de células tumorais.
[040] Os bioconjugados polímero-fármaco compreendem um fármaco, o tripeptídeo RGD e um agente de penetração, conjugados a polímeros por meio de ligações covalentes ou eletrostáticas, por um agente reticulador.
[041] O fármaco pode ser um antineoplásico, preferencialmente do tipo antraciclina, preferencialmente a doxorubicina.
[042] O agente de penetração é preferencialmente a L-arginina
[043] O polímero pode ser um polissacarídeo, preferencialmente a carboximetilcelulose.
[044] O agente reticulador pode ser selecionado do grupo compreendendo glutaraldeído, formaldeído, epicloridrina ou 1-etil-3-(3-dimetilaminopropil) carbodiimida, preferencialmente 1-etil-3-(3- dimetilaminopropil) carbodiimida.
[045] Os bioconjugados tem preferencialmente razão molar polímero:fármaco:agente reticulador:agente de penetração de 2000- 100:1:10-20:100-1000.
[046] Os bioconjugados podem estar na forma de nanopartículas coloidais em meio aquoso com carga superficial predominantemente negativa, e tamanho hidrodinâmico variando entre 10 e 100 nm.
[047] As composições farmacêuticas contêm os bioconjugados definidos acima e excipientes farmacêutica e farmacologicamente adequados.
[048] O processo de obtenção dos bioconjugados contém as seguintes etapas:
- a. Adicionar em frasco de reação 1,0 a 10 mL de solução de agente reticulador (6 a 15 % m/v) para cada 10 mL da solução de polímero (1,0 a 15,0 % m/v), sob agitação durante 15 a 60 minutos a uma temperatura entre 4 e 8 ˚C;
- b. Gotejar, sob agitação contínua, 200 a 800 μL de solução de fármaco (0,05 a 0,50 % m/v), para cada 10 mL da solução da etapa “a”, e incubar em temperatura ambiente durante 1 a 8 horas no escuro;
- c. Adicionar 1 a 10 mL de solução de agente reticulador (0,1 a 2 % m/v) para cada 12 mL de “polímero-fármaco” (obtido na etapa “b”), sob agitação durante 15 a 60 minutos em temperatura entre 4 e 8 °C;
- d. Adicionar 1,0 a 10 mL de solução do tripeptídeo RGD (0,01 a 0,5 % m/v) para cada 10 mL da solução obtida na etapa “c” e incubar durante 2 a 8 horas no escuro, sob agitação;
- e. Adicionar 1,0 a 10 mL de solução de agente reticulador (10 a 25 % m/v) e 5,0 a 20,0 mL de solução de agente de penetração (2 a 8 % m/v), nessa ordem, para cada 15 mL de “polímerofármaco-RGD” (obtido na etapa “d”);
- f. Incubar por 2 a 6 horas no escuro sob agitação;
- g. Adicionar solução de cloridrato de etanolamina (para uma concentração final de 0,1-20,0 µM) aos frascos de reação, e manter agitação durante 15 a 60 minutos para finalizar a reação;
- h. Purificar as soluções.
[049] O solvente das soluções é preferencialmente tampão MES, composto por ácido 2-(N-morfolino) etanossulfônico, 0,1 a 0,25 M, pH 5,4 a 5,6.
[050] O fármaco pode ser um antineoplásico, preferencialmente do tipo antraciclina, preferencialmente a doxorubicina; o agente de penetração a Larginina; o polímero um polissacarídeo, preferencialmente a carboximetilcelulose; o agente reticulador pode ser selecionado do grupo compreendendo glutaraldeído, formaldeído, epicloridrina ou 1-etil-3-(3- dimetilaminopropil) carbodiimida, preferencialmente 1-etil-3-(3- dimetilaminopropil) carbodiimida; e a razão molar polímero:fármaco:agente reticulador:agente de penetração pode ser de 2000-100:1:10-20:100-1000.
[051] A purificação da etapa “h” pode ser realizada por diálise em membrana de celulose de 10.000 a 25.000 Da, executada durante 24 a 48 horas no escuro, sob agitação moderada e em temperatura ambiente, sendo realizadas trocas de água sucessivas, após cada 4 a 8 horas.
[052] O sistema “polímero-fármaco”, obtido na etapa “b”, tem preferencialmente razão molar polímero:fármaco de 2000-100:1-100:10-20.
[053] O sistema de pró-fármaco referenciado como “polímero-fármacoRGD”, obtido na etapa “d”, tem preferencialmente razão molar polímero:fármaco:RGD de 2000-100:1:10-20.
[054] O sistema referenciado como “polímero-fármaco-RGD-R”, obtido na etapa “e”, tem preferencialmente razão molar polímero:fármaco:RGD:R de 2000-100:1:10-20:100-1000.
[055] Os bioconjugados da presente tecnologia podem ser usados para fabricação de medicamentos para tratamento de câncer
[056] A presente tecnologia pode ser mais bem compreendida pelos seguintes exemplos, não limitantes.
[057] O fármaco antitumoral (DOX), o tripeptídeo RGD e o agente de penetração (L-arginina) foram bioconjugados no polímero carboximetilcelulose (CMC) utilizando o cloridrato de 1-etil-3-[3- dimetilaminopropil] carbodiimida (EDC) como agente de ligação cruzada em tampão MES (ácido 2-(N-morfolino) etanossulfônico, 0,25 M, pH 5,5 ± 0,1). A solução de CMC (2,0 % m/v) foi preparada a partir da adição de particulados de carboximetilcelulose de sódio (CMC/Na, 2,0 g) em 100 mL de tampão MES sob agitação e em temperatura ambiente até ocorrer a completa solubilização. EDC, RGD, L-arginina e DOX também foram dissolvidos em tampão MES. A bioconjugação do polímero-fármaco foi realizada do seguinte modo: 1,0 mL da solução de EDC (12,5 % m/v) foi adicionada ao frasco de reação contendo 10 mL da solução de CMC (2,0 % m/v), sob agitação magnética durante 15 minutos a 6 ± 2 ˚C. Sob agitação contínua, a solução de DOX (0,145 % m/v, 400 μL) foi gotejada no frasco e o sistema foi incubado em temperatura ambiente durante 2 horas no escuro. Esse sistema foi referenciado como “CMC-DOX” (razão molar CMCunidade:DOX = 1000:1).
[058] Para a preparação do conjugado polímero-fármaco modificado com RGD, adicionou-se a solução de EDC (0,6 % m/v, 1,0 mL) em 12 mL de “CMC-DOX”, sob agitação magnética durante 15 minutos a 6 ± 2 °C. Em seguida, a solução de RGD (0,1 % m/v, 1,0 mL) foi introduzida no frasco e o sistema foi incubado em temperatura ambiente durante 2-8 horas no escuro, sob agitação magnética. Esse sistema de pró-fármaco foi referenciado como “CMC-DOX-RGD” (razão molar CMCunidade:DOX:RGD = 1000: 1: 15).
[059] Por último, o conjugado “CMC-DOX” modificado com RGD e Larginina foi preparado a partir da adição da solução de L-arginina (4,28 % m/v, 5,0 mL) em 18 mL de “CMC-DOX-RGD”, após a ativação dos grupos carboxílicos da CMC com a solução de EDC (12,5 % m/v, 1,0 mL). O sistema foi incubado a temperatura ambiente por 2 horas no escuro, sob agitação magnética e foi referenciado como “CMC-DOX-RGD-R” (razão molar CMCunidade:DOX:RGD:R = 1000:1:15:1000).
[060] Todas as amostras foram mantidas ao abrigo da luz em temperatura ambiente e, na sequência, foi adicionada a solução de cloridrato de etanolamina (concentração final de 0,1-20,0 µM) aos frascos de reação, sob agitação magnética durante 15-60 minutos para finalizar a reação. Posteriormente, os bioconjugados sintetizados foram dialisados em membrana de celulose de 12.000 Da (Kit de diálise Pur-A-Lyzer ™, Sigma) durante 24 a 48 horas no escuro, sob agitação moderada e em temperatura ambiente. As diálises foram realizadas em recipientes com capacidade para 2 L de água destilada e foram realizadas trocas de água após 4 a 8 horas. Após purificação, as soluções foram armazenadas entre 4 a 15 ˚C para posterior utilização
[061] Para avaliar a eficiência de carregamento do fármaco (DLE), os sistemas de pró-fármacos foram centrifugados, antes da diálise, (15 minutos a 14.000 rpm e 4 ± 1 ˚C, Hettich Mikro 200R) utilizando um filtro de ultracentrífuga com membrana de celulose de 50.000 Da (Filtro Amicon, Sigma). O filtrado foi coletado e analisado por espectroscopia UV-vis (Lambda EZ-210, Perkin Elmer) para determinar a concentração de DOX com base na curva de correlação de Beer-Lambert. A eficiência de carregamento (DLE,%) foi calculada a partir da Equação 1.
(1) DLE = ((A-B)/A)*100
em que A (mg.mL-1 ) é a concentração inicial de DOX em solução e B (mg.L1 ) é a concentração de DOX no filtrado.
(1) DLE = ((A-B)/A)*100
em que A (mg.mL-1 ) é a concentração inicial de DOX em solução e B (mg.L1 ) é a concentração de DOX no filtrado.
[062] Nesse exemplo, os bioconjugados compostos por CMC-DOX, RGD e L-arginina (R) foram projetados e construídos com o objetivo de integrar, em uma única estrutura macromolecular, propriedades físico-químicas, bioquímicas e quimioterápicas.
[063] Foi selecionado como a melhor alternativa para a conjugação o biopolímero com menor grau de substituição (DS = 0,7), de forma a favorecer a biodegradabilidade, e com uma massa molar acima do limite renal (Mw = 250.000 Da). Esta seleção objetivou aumentar o tempo de circulação do pro-fármaco previsto no organismo, evitando-se que os conjugados polímero-fármaco fossem rapidamente eliminados do organismo, considerando a possibilidade de aplicações clínicas dos sistemas projetados. Além disso, de acordo com a literatura, massas molares relativamente altas podem acumular-se preferencialmente em tumores, melhorando a ação terapêutica in vivo devido ao aumento dos efeitos de permeação e retenção (EPR). Com base em estudos anteriores do nosso grupo de pesquisa, a utilização de pontos quânticos fluorescentes estabilizados diretamente pela CMC em meios aquosos, permite a internalização dessa macromolécula em células tumorais e não tumorais sem a presença de vetores transmembrana. Vale ressaltar que, do ponto de vista da aplicação, CMC com diferentes graus de substituição (DS > 0.5 e DS< 2.0) e massas molares (Mw> 20.000 e Mw < 750.000 Da) apresentam comportamentos análogos e podem ser utilizados para o mesmo fim.
[064] Para acoplar covalentemente os grupos amina da DOX, do RGD e da L-arginina (R) aos grupos carboxílicos (COOH) da CMC, foi utilizado o cloridrato de 1-etil-3-(3-dimetilaminopropil) carbodiimida (EDC), para conjugação por meio de ligações amidas. Esse tipo de ligação entre polímero e fármaco foi selecionado devido à possível alteração de velocidade (cinética) de clivagem enzimática das ligações amidas pelas células cancerígenas, relatadas na literatura para outros sistemas polímeroantitumorais.
[065] As estruturas das biomacromoléculas projetadas, constituídas pela CMC-DOX e modificadas com RGD e R (CMC-DOX-RGD-R) estão esquematicamente representadas na Figura 1. As fórmulas químicas dos precursores (CMC, DOX, RGD, R e EDC) são apresentadas na Figura 2 e as representações esquemáticas dos intermediários pró-fármacos (CMCDOX e CMC-DOX-RGD) são mostradas na Figura 3.
[066] A eficiência de carregamento do fármaco (DLE) calculada foi superior a 90,0%, indicando uma elevada eficiência de encapsulamento da droga nos bioconjugados.
[067] Os bioconjugados obtidos, compostos por polímero-fármaco, foram sintetizados e extensivamente caracterizados quanto às suas propriedades e aplicações como pró-drogas quimioterápicas para tratamento de câncer. Esses sistemas foram baseados na conjugação da carboximetilcelulose (CMC, biopolímero) com a doxorrubicina (DOX, droga antitumoral) e na funcionalização com os peptídeos RGD e aminoácido L-arginina (R), visando aplicações clínicas em quimioterapia direcionada para células tumorais.
[068] As técnicas de FTIR, UV-vis e PL, comprovaram a conjugação covalente entre os grupos carboxilatos da carboximetilcelulose e os grupos amino da doxorrubicina e dos peptídeos (RGD e R) mediante a formação de ligações amidas. As medidas obtidas por potencial zeta (ZP) e espalhamento dinâmico laser (DLS) demonstraram a produção de nanopartículas coloidais com carga superficial e tamanho hidrodinâmico variando na faixa entre 30 a 90 nm, dependendo do pH e da composição química dos nanoconjugados. Esses resultados foram atribuídos à conformação tridimensional das superestruturas macromoleculares causada pelo equilíbrio de interações hidrofílicas, hidrofóbicas e eletrostáticas entre os componentes e seus grupos funcionais.
[069] Os ensaios de viabilidade celular in vitro por MTT e CVS demonstraram que a DOX (livre ou não conjugada) e todos os bioconjugados polímero-fármaco apresentaram diferentes respostas de citotoxicidade para as células tumorais (células de câncer ósseo, de mama e de cérebro, SAOS, MCF7 e U87, respectivamente) comparadas com as células normais embrionárias (HEK 293T, referência). Esse resultado foi atribuído à combinação das características físico-químicas dos bioconjugados com diferentes vias de internalização celular e mecanismos de endocitose.
[070] Ensaios biológicos adicionais com biomarcadores fluorescentes, utilizando microscopia confocal, corroboraram os resultados obtidos e elucidaram os principais mecanismos envolvidos na liberação da DOX dos sistemas polímero-fármaco nos compartimentos celulares (endossomo, lisossomo, citosol, núcleos). Essa liberação foi atribuída à clivagem das ligações amidas presente nos bioconjugados. Além disso, os conjugados CMC-DOX biofuncionalizados com RGD e arginina (R) se comportaram como eficientes sistemas de liberação de drogas, promovendo significativa redução da citocixidade das células normais (HEK 293T), ao mesmo tempo em que mantiveram elevada capacidade de provocar a morte de células tumorais. Esses resultados também foram analisados utilizando modelos matemáticos, que demonstraram os melhores perfis de liberação, compatíveis com o transporte controlado por difusão (equação de Higuchi) tanto para a DOX não ligada e quanto para os nanoconjugados CMC-DOX e CMC-DOX-RGD. Por outro lado, os conjugados CMC-DOX-RGD-R mostraram uma cinética única de liberação do fármaco sem correspondência com os modelos testados, o que validou o comportamento anômalo causado pela conjugação de RGD e R com a estrutura macromolecular, que afetou o metabolismo e a cinética celular.
[071] Portanto, os novos nanocarreadores CMC-DOX-peptídeos foram desenvolvidos e produzidos como pró-drogas inteligentes para, de forma simultânea, serem direcionados para integrinas e aumentarem a eficácia de morte de células cancerígenas, enquanto preservam células saudáveis da citotoxicidade inerente de drogas antitumorais, sendo promissoras em aplicações de quimioterapia para tratamento de câncer.
[072] As análises de FTIR foram realizadas para evidenciar a presença da ligação amida, formada após as reações de conjugação. No espectro da CMC (Figura 4a) observa-se a presença de uma banda larga e intensa centrada em 1593 cm-1 , associada a vibrações de estiramento assimétrico de grupos carboxilatos (COO- ), como era de se esperar, considerando que os grupos carboxílicos da CMC (–COOH presentes em 1730 cm-1 ) estão majoritariamente desprotonados no pH utilizado para a conjugação (pH = 5,5 - pKa ~ 4,6). Alterações na estrutura macromolecular da CMC podem ser observadas após a conjugação com a DOX.
[073] No espectro FTIR da Figura 4b observa-se o aparecimento de duas bandas de absorção, associadas à formação de ligações amidas (C = O, Amida I em 1645 cm-1 e NH e CN, Amida II em 1565 cm-1 ), após reação mediada por EDC. Além disso, a presença de bandas de vibração relacionadas com a DOX (1710 cm-1 , 1617 cm-1 , 1585 cm-1 e 1540 cm-1 ) indica a incorporação do fármaco anticancerígeno na estrutura macromolecular. Esses resultados demonstram a formação da ligação amida entre o grupo COOda CMC e o grupo amino (NH2) do fármaco.
[074] Análises FTIR dos bioconjugados CMC-DOX modificados com RGD (Arg-Gly-Asp) e L-arginina são menos evidentes, uma vez que os peptídeos exibem vibrações características de estiramento assimétrico dos grupos carboxilatos, de estiramento simétricos e assimétricos da ligação NH3 + e de dobramento da ligação NH na faixa de 1500 cm-1 a 1640 cm-1 , que são sobrepostas com a CMC, DOX e ligações amida nos espectros de FTIR (Figura 4c e 4d). No entanto, vale ressaltar o aumento expressivo nas intensidades das bandas da ligação amida no CMC-DOX-RGD-R (Figura 4d) devido à maior quantidade de espécies de aminoácidos disponíveis para a conjugação com a CMC em comparação com a DOX ou com as moléculas de RGD.
[075] A doxorrubicina (DOX) tem absorção e fluorescência intrínsecas, associadas ao grupo cromóforo antraciclina. Os espectros de absorção na região do visível da DOX (Figura 5Aa), da CMC (Figura 5Ab) e dos sistemas de pró-fármaco (CMC-DOX (Figura 5Ac), CMC-DOX-RGD (Figura 5Ad) e CMC-DOX-RGD-R (Figura 5Ae)) são mostrados na Figura 5A. Os picos característicos da DOX foram observados em λ = 450 nm, 484 nm, 497 nm e 534 nm 47,48, localizados na faixa azul-verde do espectro de absorção que fornece à DOX sua cor laranja-avermelhada característica (Figura 5B). Esses picos estão associados às transições de estado de energia π → π* da estrutura quinonóide e também foram verificados em todos os sistemas de pró-fármaco (Figura 5Ac-e), indicando que a DOX permaneceu estável após ser conjugada ao polímero. A solução de CMC, utilizada como referência, apresentou-se opticamente clara e transparente (Figura 5D) sem a presença de transições de energia na faixa do espectro visível (Figura 5Ab).
[076] A Figura 6 apresenta os espectros de fluorescência da DOX (a), da CMC (e) e dos conjugados pró-fármaco (b-d). No espectro da DOX observa-se emissão máxima em λ = 594 nm com desvio de 110 nm para a região do vermelho (deslocamento de Stokes), compatível com soluções diluídas de DOX. Ao contrário, no espectro da CMC, não se observa emissão devido à ausência de ligações insaturadas conjugada. Ainda é possível observar que a DOX preservou sua capacidade de fluorescência após a conjugação, com formação do pró-fármaco CMC-DOX, no entanto com uma atenuação de intensidade medida por meio de rendimento quântico (QY). Os valores de QY encontrados foram 1 a 25 % para as amostras DOX, CMC-DOX, CMC-DOX-RGD e CMC-DOX-RGD-R. O valor de rendimento quântico calculado para a DOX está de acordo com a literatura. Em relação aos conjugados, foram detectadas reduções significativas de, aproximadamente, 40-70 % para os sistemas CMC-DOX e CMC-DOX-RGD, e 60-90% para o complexo CMC-DOX-RGD-R. Considerando que a molécula de DOX se comporta como um fluoróforo ativo, a espectroscopia de fluorescência tem sido utilizada com sucesso para estudar alterações conformacionais e interações da DOX com os ambientes circunvizinhos, por exemplo, com DNA, RNA, peptídeos/proteínas, membranas e transportadores de drogas. Portanto neste processo foi demonstrada a efetiva ligação da DOX com a CMC pela formação dos conjugados. A interação entre essas moléculas afetou a emissão óptica por meio da extinção da fluorescência.
[077] Sistemas polímero-fármaco especialmente projetados visam reproduzir as estruturas macromoleculares dinâmicas e funcionais existentes na natureza, com conformação e tamanho que podem ser ajustados a partir da combinação de domínios hidrofóbicos e hidrofílicos e do equilíbrio de cargas. Por essa razão, o estudo de interações intermoleculares em solução é de fundamental importância para a maioria dos processos químicos e bioquímicos. O comportamento de moléculas em solução, sua estabilização ou agregação, formação de complexos e/ou interação com o solvente, é uma consequência do balanço entre suas interações intermoleculares e se torna crucial quando se considera sua aplicação biológica. Características físico-químicas tais como massa molar, tamanho de partícula, morfologia, potencial zeta e hidrofobicidade superficial são aspectos essenciais que contribuem para o comportamento integral dos sistemas biológicos in vitro e in vivo. As macromoléculas anfifílicas, como por exemplo, os polímeros, oferecem uma maneira consistente de regular o tamanho, a morfologia e a química de superfície das nanoestruturas obtidas. Além disso, combinar moléculas anfifílicas de cargas opostas pode levar à produção de morfologias diferentes daquelas obtidas por moléculas individuais. Portanto, neste processo foram projetados e sintetizados bioconjugados compostos por polímero-fármaco ligados por meio de ligações amidas, utilizando precursores de cargas opostas, ou seja, CMC negativamente carregada e DOX positivamente carregada.
[078] A análise dessas nanoestruturas supramoleculares foi realizada por medidas de espalhamento dinâmico de luz (DLS) e potencial zeta (ζ, ZP). Essencialmente, a técnica de DLS (ou espectroscopia de correlação de fótons, PCS) é amplamente utilizada para estudar o tamanho e a morfologia de nanopartículas em meios líquidos, onde as flutuações da intensidade da luz espalhada pelas partículas dispersas em função do tempo são monitoradas. Para dispersões coloidais diluídas, a taxa de decaimento da função de autocorrelação de tempo dessas flutuações de intensidade é comumente utilizada para determinar de forma direta o coeficiente de difusão translacional das partículas, o qual está relacionado ao raio hidrodinâmico da partícula (ou diâmetro hidrodinâmico, HD). Além disso, o potencial zeta (ou potencial eletrocinético) corresponde à diferença de potencial entre o meio e a camada estacionária de fluido ligado à partícula dispersa, onde forma-se uma dupla camada elétrica interfacial (DL), que é de fundamental importância no estudo de sistemas coloidais aquosos.
[079] Nesse exemplo, as medidas de potencial zeta foram avaliadas variando o pH de 4,0 (pH após a diálise) a 7,6 (pH fisiológico) e os resultados são apresentados na Figura 7. Em pH 5,0, os grupos R-COOda CMC conferem majoritariamente, o caráter aniônico desse polissacarídeo e o valor de ZP encontrado foi -40 ± 20 mV. Após a conjugação da CMC com a DOX, molécula catiônica anfifílica, o valor de ZP apresentou um aumento moderado no valor em módulo (-30 ± 15 mV), principalmente devido ao consumo de grupos carboxilatos para a formação de ligações amidas combinada a interações intermoleculares com grupos amino protonados (RNH3 + ) levando à formação de complexos eletrostáticos. Essa pequena alteração foi associada ao fato de apenas poucos grupos carboxilatos terem sido consumidos na formação de ligações amida devido à quantidade limitada de fármaco disponível para a reação quando comparada ao número de grupos COOpresentes na cadeia do biopolímero. No caso dos conjugados CMC-DOX-RGD, apesar da redução dos grupos carboxilatos causada pela conjugação covalente, os peptídeos RGD apresentaram carga total levemente negativa em pH 5,0 (ponto isoelétrico, PI ~ 6,2-6,5), levando a valores intermediários de ZP. Por outro lado, a conjugação com a L-arginina resultou em um aumento significativo das medidas de ZP (-20 a - 30 mV), atribuído as características positivas do aminoácido (PI ~ 10,5) e posterior diminuição dos grupos COOda CMC envolvidos no processo de formação das ligações amidas adicionais. À medida que houve o aumento do pH pela adição de OH- , os valores de ZP se tornaram mais negativos devido à desprotonação adicional dos grupos carboxílicos (COOH → COO- ) da CMC.
[080] Os tamanhos médios das nanoestruturas foram avaliados por DLS com base nos valores do raio hidrodinâmico (HD) dos bioconjugados polímero-fármaco. Os sistemas compostos por CMC-DOX, CMC-DOX-RGD e CMC-DOX-RGD-R, imersos em solução tampão fosfato salino (PBS - pH 7,4) apresentaram HD na faixa de 70 ± 25 nm, 30 ± 15 nm e 90 ± 30 nm, respectivamente. Nesse meio, em condições fisiológicas (PBS - pH 7,4), os valores de ZP foram similares para todos os bioconjugados (fixa de -15 a +15 mV). Essa tendência foi atribuída predominantemente aos mecanismos de protonação e desprotonação dos grupos funcionais da CMC em função do pH do meio, associados à presença de espécies positivas e negativas (cátions e ânions, alta força iônica) na solução de PBS, o que gerou um equilíbrio de cargas em meio aquoso
[081] Os resultados obtidos por DLS e ZP demonstraram que os conjugados CMC-DOX formaram sistemas macromoleculares dispersos em meio aquoso com cargas superficiais. Esses resultados eram esperados, baseados na abordagem utilizada para construir estes bioconjugados onde a CMC se comportou como uma biomacromolécula química multifuncional devido à presença de grupos carboxílicos, capazes de formarem estruturas carregadas negativamente em condições levemente ácidas e fisiológicas. Além disso, a doxorrubicina utilizada como medicamento antineoplásico foi capaz de formar estruturas carregadas positivamente devido à presença dos grupos amino no anel sacarídeo da molécula. Portanto, foi considerada a hipótese de que a conjugação covalente da CMC com a DOX formando ligações amidas, juntamente com as interações eletrostáticas e polares de várias funcionalidades químicas das duas macromoléculas, proporcionou o desenvolvimento de nanopartículas com estruturas supramoleculares (SS) dispersas em solução aquosa. De acordo com a literatura, as estruturas supramoleculares formadas por conjugados constituídos por moléculas poliméricas (por exemplo, CMC com drogas, proteínas, etc.) referem-se ao nível organizacional da estrutura como um todo devido a fortes interações intra e intermoleculares.
[082] Os resultados de HD obtidos por DLS comprovaram a formação de estruturas nanométricas dispersas em meio coloidal aquoso. Esses sistemas nanoparticulados formados devido à conjugação da CMC com a DOX estão associados à combinação de diversas interações, incluindo atrações eletrostáticas entre os grupos carboxilatos negativos da CMC e os grupos amino positivos da DOX, interações anfifílicas dos grupamentos hidrofílicos da CMC com moléculas de água e de regiões hidrofóbicas com a estrutura aromática planar da DOX. Como forma de minimizar a energia livre dos conjugados em meio aquoso polar, decorrente dessas interações, mudanças conformacionais foram observadas. O valor de HD evidenciado para o sistema CMC-DOX ficou na faixa de 60 a 90 nm, enquanto que para o sistema CMC-DOX-RGD foi de 30 a 50 nm.
[083] Considerando que os valores de ZP foram semelhantes em pH 7,4, para os dois sistemas, o tamanho relativamente maior para a CMC-DOX foi atribuído à maior repulsão entre os grupos carboxilatos, que foi balanceada pelas moléculas de água do meio, resultando em um aumento do volume da camada de solvatação. Ao ligar o peptídeo RGD (CMC-DOX-RGD), grupos carboxilatos da CMC foram consumidos pela formação de ligações amida, reduzindo a sua repulsão devido à diminuição de grupos negativos na macromolécula, o que contribuiu para a contração da estrutura coloidal e consequentemente para a obtenção de menores valores de HD nessa condição. Já a conjugação adicional do sistema CMC-DOX-RGD com L-arginina (CMC-DOX-RGD-R) evidenciou um aumento de HD, isto porque o carácter predominantemente positivo deste aminoácido resultou em alterações significativas na conformação tridimensional do sistema macromolecular para acomodar todas as interações (hidrofílica, hidrofóbica e eletrostática) existentes na nova nanoestrutura complexa produzida.
[084] Assim sendo, os bioconjugados CMC-DOX formaram nanopartículas coloidais em meio aquoso, com os grupos hidrofílicos da CMC (COOH e OH) voltados para fora de forma a interagir com as moléculas polares da água (e, eventualmente, com outras cadeias da CMC) e com as regiões hidrofóbicas orientadas em direção às moléculas de DOX, que foram “encapsuladas” para acomodar seus três anéis aromáticos planares. De modo semelhante, o peptídeo RGD e a L-arginina, incorporados na cadeia da CMC por meio de ligações amidas, devem sofrer uma orientação preferencial também por interações eletrostáticas, de van der Waals e/ou ligações de hidrogênio. A Figura 8A é a representação esquemática desses novos bioconjugados formados com estrutura “núcleo-casca” em meio aquoso.
[085] As imagens obtidas por microscopia eletrônica de transmissão (TEM) evidenciaram a formação de conjugados CMC-DOX-peptídeos com morfologia esférica, e tamanho médio (raio) variando tipicamente na faixa típica de 5 a 30 nm, similares para todos os conjugados analisados (Figura 8B). Os menores tamanhos observados por TEM estão associados à desidratação das nanopartículas durante o processo de preparação das amostras e ao fato de que o raio hidrodinâmico medido por DLS inclui o conjugado polímero-droga e camadas de solvatação.
[086] Em resumo, esses conjugados compostos por CMC-DOX-RGD-R formaram nanoestruturas supramoleculares coloidais aquosas, com propriedades físico-químicas e características morfológicas adequadas para potenciais aplicações como nanocarreadores para liberação e direcionamento de pró-fármacos.
[087] Os perfis de liberação dos fármacos conjugados com a DOX e da DOX livre (ou seja, DOX não ligada) em pH 5,5 (Figura 9A) e pH 7,4 (Figura 9B) demonstraram que a conjugação modulou o efeito de liberação do fármaco. A estabilidade química dos sistemas CMC-DOX foi realizada em meio aquoso por 7 dias em pH = 5,5, como forma de reproduzir o microambiente ácido das células cancerígenas e da vesícula lisossômica. Para os conjugados CMC-DOX e CMC-DOX-RGD, a liberação de DOX foi de 10 a 20 % e nenhuma liberação significativa foi observada para o sistema CMC-DOX-RGD-R (tipicamente ≤5 %) durante os 7 dias de incubação, comparado a mais de 50 % de liberação para a DOX livre. Além disso, em pH fisiológico 7,4 (Figura 9B) a liberação de DOX foi menor do que a verificada em meio ácido devido à reação de hidrólise ser mais lenta (cerca de 10% para o pró-fármaco CMC-DOX) e também devido à liberação de DOX livre (< 50 %), uma vez que a solubilidade do fármaco aumenta sob condições ácidas.
[088] Esses resultados estão de acordo com a literatura, em que tem sido amplamente relatada a alta estabilidade das ligações amidas em conjugados polímero-fármaco e sua lenta cinética de hidrólise em soluções aquosas neutras e levemente ácidas. A quebra de ligações amidas (CMCDOX) requer um meio ácido e reações mediadas por catalisadores (enzimas) presentes no microambiente celular (externo e interno). Por essa razão, é geralmente recomendado realizar ensaios in vitro com culturas de células cancerígenas para que ocorra um progresso no estudo do comportamento biológico dos sistemas polímero-fármacos. Além disso, os menores valores de liberação da DOX observados para os conjugados modificados com L-arginina (CMC-DOX-RGD-R) foram associados ao aumento relativo de ligações amidas se comparados com os outros sistemas de pró-fármacos avaliados
[089] Para avaliar o potencial de drogas e compostos anticâncer, diversos ensaios e testes podem ser realizados em culturas de células e modelos pré-clínicos (in vitro). O ensaio MTT é um dos mais tradicionais testes de avaliação de potencial antitumoral de compostos, e também muito comum nas avaliações de suas interações com células vivas. Portanto, neste estudo os resultados dos testes de MTT utilizando os sistemas conjugados em três tipos de células tumorais (osteosarcoma, SAOS; glioblastoma, U-87 MG; câncer mama, MCF7) e linhagem celular normal (Referencia, célula embrionária humana, HEK 293T) estão mostrados na Figura 8, que é indicador de atividade mitocondrial das células. Foi claramente observada a alta letalidade das amostras de DOX livre em duas concentrações (i.e., 1,0 µM e 10,0 µM, Figura 10A e Figura 10B, respectivamente) para todos os tipos de células testadas. Os valores de viabilidade celular foram reduzidos (concentração DOX = 1.0 µM) a praticamente 50% para células tumorais e 40% para células normais (HEK 293T). De modo semelhante, os valores foram ainda mais reduzidos em concentração maior de DOX (10,0 µM) para 40% em células tumorais e 30% em células normais. Importante ressaltar que estes resultados de MTT mostram que os efeitos citotóxicos de DOX livre foram dependentes da concentração, porém foram mais tóxicos para as células normais (i.e., HEK 293T) do que as células de câncer (i.e., SAOS, U-87 MG e MCF7). Isto é totalmente indesejável no tratamento quimioterápico de câncer, pois não existe especificidade da droga e há elevados efeitos colaterais em células e tecidos sadios.
[090] Ao contrário, os bioconjugados polímero-drogas projetados e produzidos na presente tecnologia, baseados nos sistemas CMC-DOX, apresentaram excelente comportamento especifico. Em baixa concentração (1,0 µM, Figura 10A) de DOX covalentemente ligada a CMC todos os valores de viabilidade celular foram tipicamente da ordem de 80 %, indicando fortemente que a formação de conjugado CMC-DOX reduziu significativamente a toxicidade comparada a DOX livre.
[091] Portanto, esses resultados comprovam a estratégia inovadora da presente tecnologia, de produzir pró-drogas baseadas em bioconjugados poliméricos para redução da toxicidade de agentes anticâncer. Este efeito foi atribuído à presença de ligações covalentes nos conjugados CMC-DOX que afetaram significativamente a cinética de metabolismo celular e reduziu a liberação da DOX intracelular, diminuindo consequentemente a citotoxicidade para todas as células testadas. Contudo, em maiores concentrações dos sistemas CMC-DOX (10.0 µM, Figure 10B), um efeito drástico de toxicidade foi verificado para as células tumorais, mas impressionantemente não para células normais HEK 293T. A viabilidade celular foi reduzida para apenas 40% para as células tumorais, similar aos valores obtidos para DOX livre. Por outro lado, os valores de viabilidade celular foram da ordem de 60-80% para células normais (i.e., HEK 293T).
[092] Comparando ambas as concentrações (isto é 1,0 µM e 10,0 µM, Figura 11), as diferenças de resposta da viabilidade celular para a DOX livre e os nanoconjugados CMC-DOX e CMC-DOX-RGD foram estatisticamente significantes baseado na análise realizada (Teste de Comparação Múltipla – Bonferroni; análise de variância de uma via; nível de significância α = 0,05). A mesma tendência foi observada para as células U-87 MG e para todos os bioconjugados polímero-fármaco. No entanto, não foi identificada diferença estatística para a viabilidade celular da célula HEK 293T testada com o conjugado CMC-DOX-RGD-R nestas concentrações (82% e 74%, para 1,0 µM e 10,0 µM, respectivamente) o que demonstra uma redução bastante efetiva da toxicidade da DOX em células normais, mesmo na concentração mais elevada, resultante da estratégia de conjugação com o polímero. As imagens das células HEK 293T (Figura 12) e U-87 MG (Figura 13) antes e depois do contato com os conjugados (24 h, [DOX] = 10,0 µM] ) demonstraram confluência e morfologia celular consistente com as respostas de viabilidade celular. A menor toxicidade dos conjugados CMC-DOX-RGD e CMC-DOX-RGD-R resultaram em confluência superior a 60% e aspectos morfológicos característicos de grau 2 (toxicidade moderada) de acordo com o sistema de classificação descrito na ISO 10933-5. Por outro lado, um grau 4 de alteração da morfologia celular (danos significativos na camada celular) foi observado para as células U-87 MG que apresentaram elevada letalidade na presença dos bioconjugados polímero-droga.
[093] Estes surpreendentes resultados positivos são muito importantes no que diz respeito à especificidade das drogas utilizadas no tratamento do câncer, onde os conjugados de CMC-DOX mantiveram uma elevada eficiência para eliminação das células tumorais, similares à da DOX livre, mas com efeitos colaterais (isto é, citotoxicidade in vitro) significantemente reduzidos nas células normais como resultado da estratégia da conjugação polímero-droga-peptídeos.
[094] O efeito surpreendente da presente tecnologia traz uma solução para um dos desafios mais difíceis de serem superados na oncologia no desenvolvimento de novas drogas quimioterápicas, onde as células e tecidos normais devem ser preservados das drogas citotóxicas, minimizando os efeitos colaterais sem perda da efetividade nos sítios do tumor. Aqui, o design e a síntese dos conjugados polímero-droga baseado na formação de ligações amida entre a CMC e a DOX requer a quebra destas ligações dentro da célula para a liberação do composto ativo. Uma vez liberada no citoplasma, a DOX migra para o núcleo e intercala no DNA causando a morte celular. Do ponto de vista químico e bioquímico, a maior cinética de liberação da DOX pelos bioconjugados em células tumorais é favorecida pelo metabolismo muito mais ativo destas células em comparação com das células normais, em conjunto com o pH mais ácido do microambiente do tumor.
[095] Embora não tenha sido reportado na literatura para sistemas polímero-droga baseados na CMC-DOX, outros conjugados baseados na ligação amida (por exemplo, hidrazona, éster, amida) podem ser parcialmente hidrolisados em certa extensão quando expostos ao ambiente moderadamente ácido e vesículas extracelulares no microambiente do tumor (pH extracelular, pHe), o que favorece a sua internalização pelas células cancerígenas. Além disso, após a internalização das nanopartículas dos conjugados CMC-DOX através de rotas endocíticas nas vesículas endossomais e lisossomais que apresentam pH mais ácido, as ligações amidas continuam sendo hidrolisadas por meio de catálise mediada pelas enzimas que ativam a DOX permitindo sua liberação e direcionamento para o DNA do núcleo resultando na morte celular. Assim, a estratégia de produzir conjugados sensíveis ao pH utilizando ligações covalentes cliváveis permitiu a liberação gradual do quimioterápico a partir dos sistemas nanocarreadores polímero-droga endocitados.
[096] Pode-se considerar que a liberação da DOX ocorreu mais rapidamente nas células tumorais devido à sua elevada atividade metabólica associada com o pH mais baixo e à elevada capacidade de clivagem das enzimas do lisossomo sendo o comportamento oposto associado com a menor citotoxicidade detectada in vitro para as células normais HEK 293T. Portanto, este mecanismo relacionado com o comportamento dual do conjugado polímero-droga em relação ao pH (isto é, grupos carboxilatos da CMC e ligações amida CMC-DOX) respondem aos gradientes extracelular e intracelular de pH promovendo aumento simultâneo da internalização e da liberação de drogas desencadeadas pelo pH, como a DOX, resultando no aumento da citotoxicidade para as células tumorais.
[097] Embora nanomateriais funcionais tendo sido projetados para reconhecer receptores específicos do câncer em nível celular para diagnóstico e tratamento, a redução significante da toxicidade em relação às células normais verificadas na aplicação da presente tecnologia para as células HEK 293T, como resultado da combinação destas características estímulo-responsivas em nanocarreadores de drogas não foi previamente reportada na literatura para conjugados polímero-droga. Além disso, outra importante estratégia desenvolvida na presente tecnologia foi a vetorização dos conjugados para os receptores de integrina αvβ3 presentes nas membranas celulares de células tumorais obtida pela conjugação de conjugado CMC-DOX covalentemente ligado através de agente de ligação cruzada de comprimento zero (EDC) com o tripeptídeo RGD (CMC-DOXRGD), que é um vetor de integrina, combinado com o amino ácido arginina (CMC-DOX-RGD-R) para aumento da penetração celular. Os resultados de MTT evidenciaram o efeito causado pelo RGD enxertado aos conjugados CMC-DOX (na [DOX] = 1,0 µM) com maior resposta de viabilidade celular para células de câncer de mama ((MCF7, baixa integrina) em comparação com maior toxicidade para células de glioblastoma (U-87 MG, alta integrina).
[098] Estes resultados validados por análise estatística provaram a especificidade, que somada ao efeito de “proteção” para células nãocancerígenas obtida pela presença das ligações covalentes nos conjugados CMC-DOX, promoveu um efeito adicional na letalidade para células tumorais pela vetorização in vitro utilizando o RGD, que demonstrou sua afinidade pelas células tumorais. Para maiores concentrações da droga ([DOX] = 10,0 µM) este efeito não foi observado, independente do tipo de célula, provavelmente devido a mortalidade celular causada pela elevada dose da droga. No entanto, o efeito de “proteção” observado para a célula normal (HEK 293T) foi evidenciado devido especialmente à combinação das características fisico-quimicas e bioquímicas do RGD e da arginina (R) em conjunto com as ligações amida presentes nos bioconjugados CMCDOX-RGD e CMC-DOX-RGD-R que retardaram a cinética de liberação intracelular da DOX combinado com o efeito da menor concentração de receptores de integrina na membrana das células HEK 293T. Além disso, as curvas de dose-resposta (Figura 14) e a análise do IC50 (Figura 15) provaram o efeito notável da conjugação da DOX com a cadeia do polissacarídeo CMC no comportamento de viabilidade celular da linhagem HEK 293T utilizada como referência de célula não-tumoral em comparação com todas as outras células cancerígenas.
[099] Os valores de IC50 para as células tumorais foram de 4 a 7x maiores para os bioconjugados polímero-droga em comparação com a DOX livre, indicando o efeito de modulação da liberação da droga resultante da estratégia da conjugação. As resistências observadas para a célula normal foram bastante superiores às observadas para as células tumorais e para a DOX livre, a saber: 7x, 33x e 53x superiores à DOX livre para CMCDOX,CMC-DOX-RGD e CMC-DOX-RGD-R, respectivamente. Estes resultados indicam que a estratégia de conjugação da droga em conjunto com a vetorização com peptídeos oferece novas perspectivas de terapia melhorando o prognóstico e mantendo reduzidos os efeitos colaterais em células, tecidos e órgãos sadios.
[0100] Como mecanismos complexos estão envolvidos nos medicamentos quimioterapeuticos, apenas um ensaio de viabilidade celular pode nem sempre ser suficiente para uma avaliação precisa in vitro de drogas e compostos para o tratamento do câncer. Neste sentido, foi também realizada, além do MTT, a avaliação de viabilidade celular usando o ensaio de cristal violeta (CVS).
[0101] Os ensaios de cristal violeta foram realizados com células HEK 293T (referência não tumoral) e U-87 MG (células de glioblastoma), nas concentrações de DOX e conjugados pró-drogas de 1,0 µM e 10,0 µM e dois tempos de incubação (6 h e 24 h). Os resultados (Figura 16) indicaram as mesmas tendências e elevada correlação com o ensaio de MTT. Isto é, foi observado o efeito de modulação resultante da conjugação da droga covalentemente com o polímero através das ligações amida e a notável resistência (efeito de proteção) da célula normal para os conjugados polímero-droga funcionalizados com peptídeos (RGD-R) ainda que mantendo efetiva atividade citotóxica para a célula cancerígena (U-87 MG).
[0102] A avaliação da internalização dos bioconjugados como agentes quimioterápicos foi realizada utilizando a microscopia confocal de varredura a laser (CLSM) com a finalidade de uma análise mais aprofundada dos resultados obtidos nos ensaios de viabilidade celular. Para o acompanhamento da internalização a DOX foi utilizada como biomarcador devido à sua fluorescência intrínseca no laranja-vermelho (excitação λexc = 568 nm, emissão λem = LP 585 nm). Para esta análise foram selecionadas as células HEK 293T (referência não tumoral) que apresentou uma elevada resistência em relação aos conjugados polímero-droga e a célula U-87 MG como modelo tumoral com elevada quantidade de receptores de integrina na membrana, além da elevada mortalidade de pacientes com glioblastoma. A análise foi realizada pela avaliação da internalização da DOX (livre e nos conjugados) do ambiente extracelular para o citoplasma e pela sua presença no núcleo onde ocorre grande parte do mecanismo de ação de morte celular promovido por esta droga. As imagens de microscopia confocal foram obtidas após diferentes tempos de incubação (0 min, 15 min, 30 min, 60 min, 2 h, e 6 h) com os sitemas em avaliação e as imagens de fluorescência obtidas estão apresentadas nas Figuras 12 e 13 para as células HEK 293T e U-87 MG, respectivamente.
[0103] É amplamente aceito que a internalização de nanopartículas e moléculas com dimensões nanométricas ocorre através da endocitose. Os mecanismos de captação destes materiais são extremanente complexos, tendo sido alvo de várias pesquisas, e estão além do escopo deste trabalho. Assim para esta avaliação será utilizado o processo simplificado apresentado na Figura 19 que é composto de três etapas principais: (1) transporte e internalização da droga através da biomembrana celular; (2) tráfego intracelular através das vesículas do endossoma e do lisossoma e (3) transporte da DOX para o núcleo e sua intercalação no DNA disparando o processo de apoptose.
[0104] Antes da incubação não foi detectada fluorescência (t = 0 min) relacionada à autofluorescência das células. Na sequência, nas imagens das Figuras 17(a) e 18(a) pode-se observar que o primeiro estágio, nos primeiros 15 min, está especialmente relacionado ao transporte da DOX e dos bioconjugados do meio extracelular através da membrana. Este complexo mecanismo é resultado do balanço global de diversas variáveis, a saber: natureza da célula; permeabilidade celular; carga superficial, raio hidrodinâmico e grupos funcionais da estrutura supramolecular dos conjugados CMC-DOX; forma de apresentação da droga (livre ou conjugada); dentre outros. Para as células (HEK 293T, Figura 17A, e U-87 MG, Figura 18A) incubadas com DOX livre, a fluorescência associada com a DOX pode ser observada no núcleo desde os primeiros 15 min de incubação (Figuras 17 (a) e 18(a)), apresentando um aumento qualitativo da intensidade com o aumento do tempo de incubação (Figuras 17A(b-e) e 18A(b-e)), sem a ocorrência de fluorescência significativa no citoplasma durante todo o processo. Estes resultados são consistentes com a literatura que indica que o processo de internalização da DOX livre ocorre especialmente através de difusão da droga pela membrana celular seguida de migração para o núcleo devido à sua elevada afinidade por DNA, que está contido especialmente nesta região da célula. As imagens obtidas após 15 min para os sistemas pró-drogas permite identificar de forma qualitativa, independente do tipo do biconjugado e do tipo de célula, uma elevada similaridade entre os sistemas e uma maior luminescência do que a detectada para a DOX livre. De forma a fazer esta análise de forma quantitativa, a Intensidade Média de Fluorescência (MFI) em 15 min foi calculada utilizando programa de processamento de imagens (domínio público, ImageJ, v.1.5+) e os resultados estão apresentados na Figura 20. Para as duas células incubadas com DOX livre foram verificadas pequenas variações na intensidade de PL, mas com valores estatisticamente similares, indicando que não houve diferença significativa na captação celular entre a célula normal e tumoral.
[0105] Este resultado está de acordo com os resultados de viabilidade celular, que não mostraram diferença significativa nos ensaios com DOX livre para ambos tipos de célula. Quando comparados com a intensidade dos conjugados, pode-se observar que o maior valor de luminescência indica uma maior internalização inicial dos conjugados em comparação com a DOX livre, como observado qualitativamente. Estes resultados podem ser explicados pelas diferenças de mecanismo de internalização (ativo e/ou passivo) mais as características dos sistemas que definem as interações drogas/compostos de drogas na biointerface (DOX negativamente carregada x pró-drogas negativamente carregadas; afinidade membrana celular por polissacarídeos; vetorização e ação de penetração dos peptídeos; presença de receptores de membrana, etc.). Estes resultados são importantes porque reforçam o efeito da modulação na “proteção” promovido pela estratégia de conjugação, pois mostram que mesmo com uma maior internalização houve a redução da citotoxicidade para as células normais.
[0106] O estágio 2 (Figura 19) corresponde ao intervalo de tempo entre 30 min e 120 min sendo associado a presença dos compostos pró-drogas nas vesículas celulares seguida de sua liberação no citoplasma após quebra das ligações amida, permitindo a sua migração e entrada no núcleo (Figura 17(b-d) e Figura 18(b-d)). Qualitativamente pode-se observar um aumento gradual da intensidade de fluorescência com o tempo para todos os sistemas (DOX livre e conjugada). Para as células HEK 293T incubadas com os conjugados CMC-DOX (Figura 17B(b)) e CMC-DOX-RGD (Figura 17C(b)) após 30 min a maior parte da fluorescência está localizada no citoplasma com menor intensidade no núcleo e após 1 h – 2 h (Figuras 17B(c-d) e 17C(c-d)), a fluorescência está mais concentrada no núcleo com pequena intensidade no citoplasma em acordo com o mecanismo de liberação esperado. No entanto, um comportamento diferenciado foi observado para o conjugado CMC-DOX-RGD-R (Figura 17D), uma vez que a fluorescência indica a acumulação da droga no citoplasma, independente do tempo de incubação, com menor intensidade de fluorescência no núcleo da célula. Estes resultados indicam uma taxa de liberação da DOX mais lenta e também sugere que parte do bioconjugado pode estar sendo exocitado antes da quebra das ligações amida entre a CMC e a droga. Estes resultados são consistentes com os valores de viabilidade celular medidos nos ensaios de MTT e CVS no qual o composto polímero-droga CMC-DOX-RGD-R apresentou a menor citotoxicidade. Para as células U-87 MG o padrão de distribuição da liberação da DOX foi qualitativamente similar para todos os sistemas pró-drogas (Figuras 18B, 18C e 18D). De 30 min a 2 h de incubação, as células apresentaram fluorescência no citoplasma e no núcleo, com maior intensidade no citosol nos primeiros 30 min seguida maior localização da DOX no núcleo nos demais tempos avaliados.
[0107] A modelagem matemática de liberação de drogas pode auxiliar na compreensão do efeito de diversos parâmetros, como morfologia, tamanho, carga superficial, composição química e estrutura do sistema de liberação, assim como na cinética de liberação do fármaco. Neste estudo, a DOX livre e os conjugados CMC-DOX foram analisados por meio de modelos comumente utilizados, que apesar de empregarem abordagens matemáticas relativamente simples e com um pequeno número de parâmetros, podem oferecer informações complementares sobre os mecanismos discutidos nas seções anteriores. Os resultados do estudo de liberação do fármaco in vitro utilizando células vivas foram ajustados segundo o modelo de Higuchi ([liberação cumulativa de fármaco] x t1/2) e o modelo de Korsmeyer-Peppas (log [liberação cumulativa de droga] x log t). Os parâmetros obtidos para esses modelos, como “KH”, “n” e “R2 ” estão indicados na Tabela 1. O modelo cinético que melhor se ajustou aos dados de perfil de liberação foi avaliado com base na comparação dos valores de coeficiente de regressão linear (R2 ) destes modelos (Tabela 1). Os perfis de liberação para a DOX livre e para os bioconjugados CMC-DOX e CMCDOX-RGD realizados em células HEK 293T in vitro, mostraram melhor correspondência com a equação de Higuchi, com valores de R2 iguais a 0,98, 0,93 e 0,94, respectivamente. De acordo com a literatura, os resultados obtidos sugerem que os perfis experimentais de liberação de DOX nesses sistemas foram, provavelmente, controlados por difusão. Além disso, embora os valores de R2 obtidos segundo o modelo de KorsmeyerPeppas não se mostraram os mais adequados, as amostras que apresentaram valores de n < 0,5 experimentaram difusão Fickiana, enquanto que valores de n > 0,5 indicaram difusão anômala. No entanto, para o bioconjugado CMC-DOX-RGD-R, os dados do perfil de liberação não se ajustaram bem a nenhum dos dois modelos cinéticos, o que validou os resultados e discussões apresentados acima, onde este sistema exibiu um alto “efeito de proteção” em relação à DOX nas células HEK 293T (Figura 21). Por outro lado, os dados de perfil de liberação da DOX livre e de todos os bioconjugados CMC-DOX para células U-87 MG (ou seja, células de glioma) não se ajustaram aos modelos testados (Higuchi e Korsmeyer-Peppas), o que indicou um transporte de difusão anormal (Figura 22). Este comportamento foi atribuído ao complexo metabolismo celular associado a células cancerígenas, que não se adequam a um único mecanismo de transporte, devido a diversas vias geralmente envolvidas.
[0108] Tabela 1 – Parâmetros cinéticos de liberação obtidos para a DOX livre e para os bioconjugados, após 6 horas de incubação com células HEK 293T e U-87-MG, utilizando os modelos matemáticos de Higuchi e Korsmeyer-Peppas
[0109] Uma evidência complementar da atividade da DOX liberada nos núcleos celulares foi baseada no procedimento de marcação com TOPRO® -3, que possui uma forte afinidade de ligação com o DNA. Os resultados de marcação do DNA com base em imagens obtidas por microscopia de fluorescência para as células U-87 MG, após 30 min de incubação com a DOX livre e com os conjugados são apresentados na Figura 23 (emissão do TO-PRO® -3 em azul, primeira coluna (a); emissão da DOX em vermelho, segunda coluna (b); sobreposição de ambos os biomarcadores, terceira coluna (c)). Observou-se para a DOX livre, que após 30 min de incubação, a fluorescência azul específica para a marcação de núcleos foi significativamente sobreposta com a fluorescência vermelha, demonstrando a predominância de DOX em regiões ricas em DNA nas células. Esses resultados validaram o principal mecanismo de morte celular da DOX como droga antitumoral, por meio da ligação ao DNA celular causando apoptose, como amplamente relatado na literatura. Em relação aos bioconjugados (CMC-DOX, CMC-DOX-RGD e CMC-DOX-RGD- R), após 30 min de incubação, foram observadas intensidades de fluorescência da DOX relativamente baixas nos núcleos e DOX também dispersa no citosol, o que sugere diferentes vias endocíticas celulares. Estes resultados corroboraram os discutidos nas seções anteriores, onde os grupos funcionais da CMC (por exemplo -OH e -COOH), combinados com os peptídeos de afinidade (CMC-DOX-RGD e CMC-DOX-RGD-R), afetaram significativamente as interações bioquímicas nas biointerfaces da membrana celular, a internalização celular e o perfil cinético de liberação do fármaco.
[0110] Considerando que macromoléculas como, por exemplo, polímeros e seus derivados são transportados ao longo de via endossomal- lisossomal, marcador de membrana do lisossomo, como o corante LysoTracker® (emissão no verde, excitação λexc = 488 nm, emissão λem = 505-550 nm), foi utilizado como ferramenta de bioimagem para rastreamento do comportamento lisossômico associado ao mecanismo de endocitose dos bioconjugados nas células. Portanto, os conjugados CMC-DOX-RGD-R demonstraram boa co-localização com os endossomos e lisossomos das células, evidenciado pela presença de regiões amarelas nas mesmas imagens de CLSM (Figura 24), causadas pela sobreposição da fluorescência verde do marcador de lisossomo e da fluorescência vermelha da doxorubicina.
[0111] Considerando os tempos de incubação de 30 min e 2 h, foi possível observar uma significativa diferença entre as células HEK 293T e U-87 MG, uma vez que as imagens mostraram uma maior densidade de vesículas endo-lisossomais (ELV) em células tumorais quando comparadas a células normais. Este comportamento evidenciou a estratégia bem sucedida adotada, que consistiu na conjugação do peptídeo RGD (Arg-Gly-Asp) nos sistemas CMC-DOX, capazes de se ligarem de forma específica aos receptores de integrina αvβ3 presentes nas células cancerígenas. As células de glioma superexpressam em suas membranas, domínios ricos em integrina e, portanto, demonstraram alta afinidade pelo RGD presente nos bioconjugados CMC-DOX-RGD e CMC-DOX-RGD-R. Dessa forma, a elevada afinidade entre o tripeptídeo e os receptores da integrina αvβ3 na matriz extracelular (ECM) das células cancerígenas foi responsável por desencadear a endocitose por vias endo-lisossômicas, que foram mais pronunciadas devido ao maior metabolismo das células cancerígenas. As vesículas endo-lisossômicas são responsáveis pelo tráfego e pela degradação dos bioconjugados no processo de endocitose o que resultou em maior taxa de liberação de DOX no citosol e morte celular. Ao contrário, as células normais HEK 293T apresentaram uma densidade consideravelmente menor de vesículas endo-lisossômicas, resultado verificado nas imagens de fluorescência, devido a menor quantidade de receptores da integrina αvβ3 na membrana em conjunto com um metabolismo celular mais lento. Estes resultados são consistentes com os verificados por MTT e CVS discutidos nas seções anteriores (e confirmado pelo modelo matemático de perfil de liberação), onde as células HEK 293T apresentaram maiores respostas de viabilidade celular para os conjugados polímero-fármaco-peptídeo, enquanto que as células cancerígenas U-87 MG foram efetivamente mortas
[0112] Em resumo, foi demonstrada a afinidade do conjugado CMC-DOXRGD-R pelos receptores de integrinas αvβ3 superexpressos em células U87 MG, o que afetou distintamente as vias endocíticas das células normais e cancerígenas e regulou a taxa de liberação da droga antitumoral ativa, preservando as células normais HEK 293T da toxicidade do fármaco e ao mesmo tempo ocasionando, de forma efetiva, a morte das células tumorais U-87 MG.
[0113] A Figura 25 mostra os resultados obtidos por microscopia de fluorescência confocal a laser evidenciando a presença de células apoptóticas marcadas com Anexina V-Alexa Fluor™ 488, após a incubação de células HEK 293T e U-87 MG com a DOX livre e com todos os conjugados por 6 h. Foi claramente observado que tanto as células normais quanto as tumorais apresentaram células apoptóticas após incubação com DOX livre e com os sistemas conjugados durante 6 h. Estes resultados demonstraram a eficiente liberação de DOX pelos conjugados pró-drogas, os quais seguiram as vias de apoptose induzidas pelo fármaco levando à morte celular. Esses resultados são consistentes com a literatura.
Claims (13)
- Bioconjugados polímero-fármaco, caracterizados por compreenderem um fármaco, o tripeptídeo RGD e um agente de penetração, conjugados a polímeros por meio de ligações covalentes ou eletrostáticas, por um agente reticulador.
- Bioconjugados polímero-fármaco, de acordo com a reivindicação 1, caracterizados pelo fármaco ser um antineoplásico, preferencialmente do tipo antraciclina, preferencialmente a doxorubicina.
- Bioconjugados polímero-fármaco, de acordo com a reivindicação 1, caracterizados pelo agente de penetração ser a Larginina.
- Bioconjugados polímero-fármaco, de acordo com a reivindicação 1, caracterizados pelo polímero ser um polissacarídeo, preferencialmente a carboximetilcelulose.
- Bioconjugados polímero-fármaco, de acordo com a reivindicação 1, caracterizados pelo agente reticulador ser selecionado do grupo compreendendo glutaraldeído, formaldeído, epicloridrina ou 1-etil3-(3-dimetilaminopropil) carbodiimida, preferencialmente 1-etil-3-(3- dimetilaminopropil) carbodiimida.
- Bioconjugados polímero-fármaco, de acordo com as reivindicações 1 a 5, caracterizados pela razão molar polímero:fármaco:agente reticulador:agente de penetração ser de 2000- 100:1:10-20:100-1000.
- Bioconjugados polímero-fármaco, de acordo com as reivindicações 1 a 6, caracterizados por estarem na forma de nanopartículas coloidais em meio aquoso com carga superficial predominantemente negativa e tamanho hidrodinâmico variando entre 10 e 100 nm.
- Composições farmacêuticas caracterizadas por conterem os bioconjugados definidos na reivindicação 1 e excipientes farmacêutica e farmacologicamente adequados.
- Processo de obtenção dos bioconjugados definidos na reivindicação 1, caracterizado por compreender as seguintes etapas:
- a. Adicionar em frasco de reação 1,0 a 10 mL de solução de agente reticulador (6 a 15 % m/v) para cada 10 mL da solução de polímero (1,0 a 15,0 % m/v), sob agitação durante 15 a 60 minutos a uma temperatura entre 4 e 8 ˚C;
- b. Gotejar, sob agitação contínua, 200 a 800 μL de solução de fármaco (0,05 a 0,50 % m/v), para cada 10 mL da solução da etapa “a”, e incubar em temperatura ambiente durante 1 a 8 horas no escuro;
- c. Adicionar 1 a 10 mL de solução de agente reticulador (0,1 a 2 % m/v) para cada 12 mL de “polímero-fármaco” (obtido na etapa “b”), sob agitação durante 15 a 60 minutos em temperatura entre 4 e 8 °C;
- d. Adicionar 1,0 a 10 mL de solução do tripeptídeo RGD (0,01 a 0,5 % m/v) para cada 10 mL da solução obtida na etapa “c” e incubar durante 2 a 8 horas no escuro, sob agitação;
- e. Adicionar 1,0 a 10 mL de solução de agente reticulador (10 a 25 % m/v) e 5,0 a 20,0 mL de solução de agente de penetração (2 a 8 % m/v), nessa ordem, para cada 15 mL de “polímerofármaco-RGD” (obtido na etapa “d”);
- f. Incubar por 2 a 6 horas no escuro sob agitação;
- g. Adicionar solução de cloridrato de etanolamina (para uma concentração final de 0,1-20,0 µM) aos frascos de reação, e manter agitação durante 15 a 60 minutos;
- h. Purificar as soluções.
- Processo de obtenção de bioconjugados, de acordo com a reivindicação 9, etapas “a” a “g”, caracterizado pelo solvente das soluções ser tampão MES, composto por ácido 2-(N-morfolino) etanossulfônico, 0,1 a 0,25 M, pH 5,4 a 5,6.
- Processo de obtenção de bioconjugados, de acordo com a reivindicação 9, etapas “a” a “g”, caracterizado pelo fármaco ser um antineoplásico, preferencialmente do tipo antraciclina, preferencialmente a doxorubicina; o agente de penetração ser a L-arginina; o polímero ser um polissacarídeo, preferencialmente a carboximetilcelulose; o agente reticulador ser selecionado do grupo compreendendo glutaraldeído, formaldeído, epicloridrina ou 1-etil-3-(3-dimetilaminopropil) carbodiimida, preferencialmente 1-etil-3-(3-dimetilaminopropil) carbodiimida; e a razão molar polímero:fármaco:agente reticulador:agente de penetração ser de 2000-100:1:10-20:100-1000.
- Processo de obtenção de bioconjugados, de acordo com a reivindicação 9, etapa “h”, caracterizado pela purificação ser realizada por diálise em membrana de celulose de 10.000 a 25.000 Da, executada durante 24 a 48 horas no escuro, sob agitação moderada e em temperatura ambiente, sendo realizadas trocas de água sucessivas, após cada 4 a 8 horas.
- Uso dos bioconjugados definidos nas reivindicações 1 a 7, caracterizado por ser para fabricação de medicamentos para tratamento de câncer.
Priority Applications (1)
Application Number | Priority Date | Filing Date | Title |
---|---|---|---|
BR102019009919-4A BR102019009919A2 (pt) | 2019-05-15 | 2019-05-15 | Bioconjugados polímero-fármaco, composições farmacêuticas, processo de obtenção e uso |
Applications Claiming Priority (1)
Application Number | Priority Date | Filing Date | Title |
---|---|---|---|
BR102019009919-4A BR102019009919A2 (pt) | 2019-05-15 | 2019-05-15 | Bioconjugados polímero-fármaco, composições farmacêuticas, processo de obtenção e uso |
Publications (1)
Publication Number | Publication Date |
---|---|
BR102019009919A2 true BR102019009919A2 (pt) | 2022-02-01 |
Family
ID=80038688
Family Applications (1)
Application Number | Title | Priority Date | Filing Date |
---|---|---|---|
BR102019009919-4A BR102019009919A2 (pt) | 2019-05-15 | 2019-05-15 | Bioconjugados polímero-fármaco, composições farmacêuticas, processo de obtenção e uso |
Country Status (1)
Country | Link |
---|---|
BR (1) | BR102019009919A2 (pt) |
-
2019
- 2019-05-15 BR BR102019009919-4A patent/BR102019009919A2/pt unknown
Similar Documents
Publication | Publication Date | Title |
---|---|---|
JP6812471B2 (ja) | 新規ブロックコポリマーおよびミセル組成物ならびにその使用法 | |
Liu et al. | Hollow mesoporous silica nanoparticles facilitated drug delivery via cascade pH stimuli in tumor microenvironment for tumor therapy | |
Mansur et al. | Design and development of polysaccharide-doxorubicin-peptide bioconjugates for dual synergistic effects of integrin-targeted and cell-penetrating peptides for cancer chemotherapy | |
Shen et al. | Luminescent/magnetic hybrid nanoparticles with folate-conjugated peptide composites for tumor-targeted drug delivery | |
Qu et al. | Anisamide-functionalized pH-responsive amphiphilic chitosan-based paclitaxel micelles for sigma-1 receptor targeted prostate cancer treatment | |
Zhang et al. | Stepwise dual targeting and dual responsive polymer micelles for mitochondrion therapy | |
Wang et al. | Encapsulation of 2-methoxyestradiol within multifunctional poly (amidoamine) dendrimers for targeted cancer therapy | |
Lainé et al. | Conventional versus stealth lipid nanoparticles: formulation and in vivo fate prediction through FRET monitoring | |
Guo et al. | Matrix metalloprotein-triggered, cell penetrating peptide-modified star-shaped nanoparticles for tumor targeting and cancer therapy | |
Shim et al. | Reduced graphene oxide nanosheets coated with an anti-angiogenic anticancer low-molecular-weight heparin derivative for delivery of anticancer drugs | |
US9901616B2 (en) | Apoptosis-targeting nanoparticles | |
Deshpande et al. | Biotin-tagged polysaccharide vesicular nanocarriers for receptor-mediated anticancer drug delivery in cancer cells | |
Cai et al. | Reduction-and pH-sensitive hyaluronan nanoparticles for delivery of iridium (III) anticancer drugs | |
Wang et al. | Fluorescent carbon dot-gated multifunctional mesoporous silica nanocarriers for redox/enzyme dual-responsive targeted and controlled drug delivery and real-time bioimaging | |
Xiao et al. | Structure-based design of charge-conversional drug self-delivery systems for better targeted cancer therapy | |
Qi et al. | Hyaluronic acid-grafted polyamidoamine dendrimers enable long circulation and active tumor targeting simultaneously | |
Kang et al. | pH-sensitive fluorescent hyaluronic acid nanogels for tumor-targeting and controlled delivery of doxorubicin and nitric oxide | |
US10555965B2 (en) | Environment-responsive hyaluronic acid nanoparticles | |
US10786465B2 (en) | Polymer/copolymer nanoparticles conjugated to gambogic acid | |
Hamelmann et al. | Single-chain polymer nanoparticles in biomedical applications | |
Nehate et al. | Redox responsive polymersomes for enhanced doxorubicin delivery | |
Dai et al. | A mitochondria-targeted supramolecular nanoplatform for peroxynitrite-potentiated oxidative therapy of orthotopic hepatoma | |
Qu et al. | Targeted delivery of doxorubicin via CD147-mediated ROS/pH dual-sensitive nanomicelles for the efficient therapy of hepatocellular carcinoma | |
Hu et al. | Functionalization of mesoporous organosilica nanocarrier for pH/glutathione dual-responsive drug delivery and imaging of cancer therapy process | |
US10905653B2 (en) | Sequentially decomposable polypeptide-based nanocarriers with protective shell and preparation thereof |
Legal Events
Date | Code | Title | Description |
---|---|---|---|
B150 | Others concerning applications: publication cancelled [chapter 15.30 patent gazette] |
Free format text: ANULADA A PUBLICACAO CODIGO 15.21 NA RPI NO 2526 DE 04/06/2019 POR TER SIDO INDEVIDA. |
|
B03A | Publication of a patent application or of a certificate of addition of invention [chapter 3.1 patent gazette] |